Santa Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores, agora e na hora da nossa morte.
Hospital de Santa Maria. Hospital de dia. Primeira consulta.
Todos nos recebem muito bem. É um acolhimento bastante amigável, fazendo jus à hospitalidade portuguesa, mas desta vez virada para nacionais. Ou seremos todos encarados como uma espécie de estrangeiros, apesar de partilharmos a mesma nacionalidade com eles? Por todas as salas, ou gabinetes, por onde passamos, a pergunta é a mesma: é recente? Descobriu há pouco tempo? Depois apresentam-nos um rol de opções e serviços, que, segundo as afáveis enfermeiras que nos fazem a triagem, estarão sempre à nossa disposição.
Entre triagens, conversas com nutricionistas e a espera para a primeira consulta com o director do serviço, aparece-nos outra simpática senhora, outro grande sorriso, que, uma vez que temos ainda algum tempo de espera pela frente, nos convida para uma “primeira conversa” – a psicóloga de serviço. E lá vamos nós, deliciadas com toda aquela atenção que nos dispensam naquele importante momento em que, ainda a medo, damos os primeiros passos no que, por si só, já é a nova etapa que mudará para sempre as nossas vidas.
Depois de dez minutos à conversa, conscientemente programados pela profissional, e ilusoriamente de alívio para a utente, fica a promessa de contacto para marcarmos mais uma sessão. Mas, antes que me esqueça, posso-lhe pedir um favor? Importa-se de preencher este questionário? É anónimo, e de grande importância para nós, aqui no hospital. Claro que sim, não me custa nada!
E assim ficámos, a Doutora Sonia e eu.
Não só nunca mais nos contacta, como, na vez seguinte que nos cruzamos, a Doutora Sonia não nos reconhece, nem demora o olhar no nosso rosto por mais que uns breves segundos. Pergunto-me por vezes, caso não tivesse respondido aquele questionário repetitivo e por vezes sem sentido, ou tivesse dado ares de coitadinha, que vive num bairro social, pendurada num rendimento mínimo, em vez de ser classe média, com alguma formação académica, e que se esfalfa a trabalhar para viver condignamente, se teria havido uma segunda conversa.
Até compreendo que naquele serviço hospitalar específico, as psicólogas façam um papel similar às assistentes sociais, pelo que dêem mais atenção a quem se apresente como pertencente a uma classe social mais desfavorecida. Mas não teremos todos os mesmos direitos? Não lhes ocorre que uma conversa, de tempos a tempos, com um profissional treinado, ajuda a organizar as ideias de qualquer um, independentemente da sua condição social?
Neste caso, e se calhar infelizmente para quem ali anda, a questão não será propriamente psicossomática, mas uma palmadinha “psicológica” nas costas sempre dá outro ânimo!
Luísa